segunda-feira, 27 de maio de 2024

Reuniões Mediúnicas – Mediunidade com Jesus

  Casa Espírita Missionários da Luz

DIJ / Juventude:  > 14 anos                                   24/05/2024

 Tema: Reuniões Mediúnicas – Mediunidade com Jesus

 Objetivo:

- Conhecer como acontecem as reuniões mediúnicas nas CEs e seu objetivo de auxílio aos Espíritos em sofrimento;

- Identificar os papéis exercidos nas reuniões mediúnicas.

Bibliografia:

- O Livro dos Espíritos, perg. 163 à 165 (Perturbação após a morte);

- Livros dos Médiuns, Cap. 25, item 281 (objetivo das evocações), Cap. 29, itens 324, 331, 333, 335 e 341 (reuniões espíritas);

- O Céu e o Inferno, 2ª parte, Cap VI - Criminosos arrependidos > 'O Espírito de Castelnaudary';

- Revista espírita, Fev/1860 > História de um danado

- Diálogo com as Sombras, Hermínio Miranda;

- Reuniões Mediúnicas, Projeto Manoel Philomeno de Miranda (papéis dos participantes e objetivos das reuniões);

- Recordações da Mediunidade, Yvonne Pereira, Cap.8 Complexos Psíquicos.

https://dij-cemil.blogspot.com/search/label/Perturba%C3%A7%C3%A3o%20Ap%C3%B3s%20a%20Morte – estudo sobre a perturbação dos Espíritos após a morte.

Material: Um exemplar do Livro dos Espíritos

Roteiro:

1.  Hora da novidade, exercícios de respiração profunda e prece de início. 

2.  Motivação ao tema

Apresentar o caso da situação do Espírito criminoso que foi apresentado por Kardec no Céu e Inferno e que também foi publicado na Revista Espírita. 

Numa casinha, perto de Castelnaudary, havia barulhos estranhos e diversas manifestações que a cidade a considerava como mal assombrada.

O proprietário, Sr. D..., que quis morar lá, morreu nela, subitamente, alguns anos depois; seu filho, que também quis morar lá em seguida, recebeu, um dia, entrando num dos cômodos, uma vigorosa bofetada dada por uma mão desconhecida; como estava perfeitamente sozinho, não pôde duvidar de que se tratava uma fonte oculta, e por isso decidiu deixá-la definitivamente. Há, na região, uma tradição segundo a qual um grande crime teria sido cometido nessa casa.

Kardec teve notícia desse assunto e evocou esse Espírito na Sociedade Espírita de Paris, em 1859. O Espírito se manifestou por sinais de violência; todos os esforços para acalmá-lo foram impotentes. Um médium vidente que assistia à evocação, viu-o no momento em que se quis fazê-lo escrever; ele sacudia fortemente o braço do médium: seu aspecto era apavorante; vestia uma camisa coberta de sangue, e segurava um punhal.

O Espírito foi evocado de novo mais vezes e, pouco a pouco, mostrou-se submisso e arrependido. Das explicações fornecidas por ele e por outros Espíritos, descobriu-se que em 1608 ele morava naquela casa, onde assassinou o irmão, por ciúmes da esposa do irmão. Golpeou-o na garganta enquanto ele dormia, e acabou se casando com a cunhada, agora viúva do irmão. Alguns anos depois, acabou matando também a mulher, ex-cunhada. Morreu em 1659 com a idade de oitenta anos, sem ter sido perseguido por esses homicídios, aos quais se prestava pouca atenção naqueles tempos de confusão.

Desde sua morte, não parou de fazer o mal, e provocou vários dos acidentes ocorridos naquela casa.

Kardec perguntou ao Espírito São Luís: Tende a bondade de nos descrever o gênero de suplício desse Espírito.

Resposta: É atroz para ele; foi condenado a permanecer na casa onde o crime foi cometido, sem poder dirigir seu pensamento para outra coisa que não esse crime, sempre diante de seus olhos, e ele se crê condenado a essa tortura por toda a eternidade. Ele se vê constantemente no momento em que cometeu seu crime; toda outra recordação lhe é retirada, e toda comunicação com um outro Espírito, proibida; não pode, na Terra, ficar senão nessa casa, e se estiver no espaço, fica nas trevas e na solidão.

Kardec: Faz dois séculos que ele está nessa situação; ele aprecia esse tempo como se estivesse vivo; ou seja, o tempo lhe parece tão longo ou menos longo do que se estivesse vivo?

Resposta: Parece-lhe mais longo: o sono não existe para ele.

3.  Desenvolvimento do tema

- Pedir aos jovens que opinem sobre o caso relatado.

==> Para incentivar as reflexões:

- Qual era o estado mental do Espírito? (fixado na época do crime, não foi justiçado pelas autoridades da época. 200 anos preso naquela cena!);

- As vítimas dele também estavam presos na cena do crime? (Não. Quando seguimos adiante, perdoando, nos libertamos do mal e continuamos nossa trajetória evolutiva em novas experiências. Já o assassino, ficou ali, preso, cristalizado no momento do crime a partir de quando ele se perdeu naquela encarnação.)

- Nesses 200 anos, ele melhorou a sua condição? Conseguiu chegar ao arrependimento? (Não! A ideia fixa na culpa, o manteve estacionado mentalmente.)

- Quando que ele melhorou e conseguiu se libertar daquela ideia fixa? (Quando foi acolhido em reuniões mediúnicas, que o trataram com paciência, compaixão, preces.)

- Formar duplas para responder a pergunta que cada dupla deve receber: (5 min)

i) O que são reuniões mediúnicas?

ii) Quais os papéis/atuações dos participantes de uma reunião mediúnica?

iii) Quais os tipos de Espíritos que se comunicam nas reuniões mediúnicas nas CEs? iv) Quem escolhe quais Espíritos se comunicarão nas reuniões mediúnicas?

(Obs.: Se não houverem 4 duplas, dividir as perguntas entre as duplas formadas).

 - Ouvir as respostas das duplas, sempre perguntando se alguém quer complementar alguma resposta trazida pelas duplas. Complementar se for necessário:

- A reunião mediúnica é uma reunião de espíritas, para o intercâmbio mediúnico, com o objetivo de aprendizado para os encarnados e atendimento aos espíritos sofredores. Também temos orientações dos mentores espiritais da Casa Espírita.

- Esclarecer que nossa Casa possui um Regimento Interno para o grupo mediúnico, que está disponível no nosso site, onde estabelece que o grupo deve ter de 04 às 10 participantes.

- Papéis: Dirigente, médiuns, dialogadores, sustentação.

- Quem se comunica?  Espíritos sofredores, obsessores, mistificadores, mentores espirituais da CE, Espíritos amigos dos comunicantes.

- Quem escolhe quem vai se comunicar? A equipe espiritual que dirige o trabalho mediúnico do grupo. Não costumamos fazer evocações. As comunicações são todas espontâneas. 

- Baseado nas evocações no caso do Espírito que assombrava aquela casa, vocês podem ter uma ideia de como acontece o diálogo entre o dialogador e o Espírito comunicante: (fazer as perguntas direcionadas aleatoriamente a um dos jovens)

- O dialogador sabe quem está se comunicando?

- Mesmo nas evocações, o dialogador não necessariamente sabe quem é o Espírito, pois outro pode responder no lugar do evocado.

Aqui nas CEs, como as comunicações são espontâneas, não sabemos quem se comunica. Então, o dialogador precisa conversar com ele para procurar perceber qual o seu problema e a razão do sofrimento dele.

Como são os mentores que selecionam quem vai se comunicar existe um motivo pelo qual o Espírito para a reunião.

É preciso muita atenção, respeito, desejo sincero de ajudar o Espírito, procurando entender sua problemática e orientar com as diretrizes evangélicas.

Por isso, é muito importante o estudo da Doutrina Espírita!

- Pedir que um dos jovens leia a perg. 163 e 164 do Livro dos Espíritos:

163. A alma tem consciência de si mesma imediatamente depois de deixar o corpo?

Imediatamente não é bem o termo. A alma passa algum tempo em estado de perturbação.”

==> O Espírito da casa mal assombrada estava em perturbação mental a quanto tempo? 200 anos!

164. A perturbação que se segue à separação da alma e do corpo é do mesmo grau e da mesma duração para todos os Espíritos?

Não; depende da elevação de cada um. Aquele que já está purificado se reconhece quase imediatamente, pois que já se libertou da matéria durante a vida do corpo, enquanto que o homem carnal, aquele cuja consciência ainda não está pura, guarda por muito mais tempo a impressão da matéria.”

 - Todos os Espíritos que se comunicam sabem que estão desencarnados? Não!

- Nesse caso, devemos contar-lhes que já desencarnaram?

- Depende da situação de esclarecimento do Espírito com relação à vida após a morte. É preciso muito tato e cuidado para ir passando informações sobre a imortalidade.

- Pedir que outro jovem leia os 2 primeiros parágrafos do comentário de Kardec da perg. 165:

Por ocasião da morte, tudo, a princípio, é confuso. De algum tempo precisa a alma para se reconhecer. Ela se acha como que aturdida, no estado de uma pessoa que despertou de profundo sono e procura orientar-se sobre a sua situação. A lucidez das ideias e a memória do passado lhe voltam, à medida que se apaga a influência da matéria que ela acaba de abandonar, e à medida que se dissipa a espécie de névoa que lhe obscurece os pensamentos.

Muito variável é o tempo que dura a perturbação que se segue à morte. Pode ser de algumas horas, como também de muitos meses e até de muitos anos. Aqueles que, desde quando ainda viviam na Terra, se identificaram com o estado futuro que os aguardava, são os em quem menos longa ela é, porque esses compreendem imediatamente a posição em que se encontram.

- Durante a comunicação, onde fica o Espírito comunicante?

- Nem sempre ele está na sala mediúnica! Às vezes é o médium que se desloca até o Espírito, através de desdobramento (emancipação da alma).

- Quando acaba o diálogo?

- Quando o Espírito é atendido, adormecido, ou depois de um tempo quando o diálogo não evolui. 

4. Fixação do conteúdo: simulação de uma reunião mediúnica.

Pedir voluntário para o papel de dialogador.

O evangelizador será o Espírito comunicante.

O médium será o outro evangelizador que dará informações do caso, obtidas através da vidência.

Os demais devem acompanhar em silêncio o diálogo.

==> Se for necessário, os demais jovens podem fazer o papel do dialogador, um por vez.

(Informações sobre o Espírito comunicante em anexo) 

Médium: Estou vendo um Espírito que se apresenta como sendo de pele negra, lá pelos seus 45 anos, com sinais de extrema pobreza nas roupas, e uma doença grave que lhe deixou o corpo todo inchado, principalmente os pés. Ele está numa espécie de chácara muito pobre, trabalhando numa plantação de ervilhas.

Espírito começa a comunicação: Ai, meu Deus… como meus pés estão doendo...

(O restante deverá ser através das perguntas que o jovem (dialogador) faz o e evangelizador (Espírito) vai respondendo.)

Após um tempo de comunicação, fazer a avaliação com o grupo do atendimento feito:

- o Espírito foi atendido?

==> Reforçar que é sempre preciso avaliar todas as comunicações ocorridas durante a reunião para poder extrair os ensinamentos que as mesmas trazem ao grupo mediúnico. 

5. Passes coletivos e prece final. 

Avaliação:

Encontro com 6 jovens com participação. No exercício do diálogo com o Espírito comunicante, ficaram tímidos, sem saber o que perguntar. Não tinham ideia dos participantes de reunião mediúnica, e achavam que pessoas que perderam familiares poderiam participar das reuniões pra conversar com eles.

Anexos 


Informações sobre o Espírito comunicante e trechos adaptados do diálogo relatado por Yvonne Pereira em Recordações da Mediunidade – Cap. 8 - Complexos psíquicos

Pelo ano de 1958, um parente meu, a quem nestas páginas tratarei pela inicial C, adoeceu  gravemente, declarando os médicos consultados tratar-­se de úlcera do duodeno. Chamada que fui, do Estado de Minas Gerais, onde então me encontrava, a fim de auxiliar no tratamento ao doente, logo de início constatei, por minha vez, que, além da enfermidade física, muito bem diagnosticada pelos médicos, existiam ainda, na pessoa de C, as influências psíquicas deletérias de duas entidades desencarnadas sofredoras, agravando-­lhe o mal, as quais eu  distinguia facilmente, através da vidência, detendo­-se, de preferência, no próprio aposento particular de C, uma delas com a particularidade de se deixar ver deitada no soalho, sobre uma velha esteira e um travesseiro roto e seboso, sem fronha, e coberto com uns miseráveis restos de cobertor. (...)

Tratava-­se do fantasma de um homem de cor negra, regulando quarenta anos de idade, alto e corpulento, obeso, indicando enfermidade grave, pois dir­-se-­ia atacado de inchação geral, como quem padecesse de grandes males renais. Os pés, muito visíveis, estavam descalços e traíam inchação impressionante e a entidade se deixava ver muito pobremente trajada. 

O meu parente C residia numa casa recém ­adquirida, no Rio de Janeiro, casa que fora reformada pelo anterior proprietário e que por isso mesmo tomara aspecto assaz agradável. Essa casa, no entanto, fora erguida em terreno onde existira um casebre, sendo este demolido para a nova construção. 

Uma vez, transportada ao estado de espírito semi ­liberto, vi que desaparecera a casa atual e, em seu lugar, via­-se apenas um terreno com um casebre construído em adobes, coberto de telhas velhas, com janelas minúsculas, sem vidros, e portas muito toscas, de tábuas grosseiras, e chão de terra batida. Algumas plantações já arruinadas se deixavam ver, tais como couves, quiabos, gilós, etc., e, sobrepondo­-se a todas, pela quantidade, arbustos de ervilhas com estacas de taquara. Compreendi que ali existira viçosa chácara de hortaliças, mas que a decadência adviera depois, por circunstâncias que no momento não me foi possível compreender. Dois ou três galos de briga, tipo chinês, iam e vinham pelo terreno, ciscando e cacarejando. 

Lixo amontoado a um canto e sinais suspeitos de fogo em círculo indicavam a esterqueira para o adubo às plantas e também que o habitante do casebre fora dado à prática de magias, de “macumba”, como vulgarmente é conhecida a dita prática no dialeto popular brasileiro. 

Um negro ainda moço, ou o seu Espírito, corpulento, simpático, cuidava das ervilhas com muita atenção, amarrando­-as com tiras de “imbira” às estacas. Usava camisa branca andrajosa, calças escuras com muito uso e sujas de terra, chapéu de feltro velhíssimo, e tudo oferecendo visão de extrema pobreza e decadência. Pés descalços, inchados, como que atacados de elefantíase, enquanto o corpo reluzia, deformado pela inchação. 

Com a orientação do Espírito Guia Charles, fui informada de que aquela entidade chamara-­se Pedro, quando encarnada, residira no casebre, e que, agora, desencarnada, continuava no mesmo local, fixando o pensamento no cenário  passado e, por isso mesmo, construindo-­o ao derredor de si, para seu  desfruto  ou seu infortúnio, à força de tanto recordá­-lo, sendo, portanto, esse o seu “ambiente imediato”, ou seja, tipo de criação mental sólida.

Charles acrescentou:

— “Entrego­-te esse pobre irmão para que o consoles dos seus infortúnios, instruindo­-o nos princípios da renúncia aos bens terrenos, que ainda aprecia, pela aquisição dos bens espirituais.

Compreendi que insólita confusão se estabelecera no entendimento do pobre Espírito, o qual, se via nova casa no local da sua e a reforma geral do terreno, também continuava vivendo no seu  amado casebre, o que equivale dizer que, criando ele mesmo o seu  ambiente, através das recordações fixadas na mente, residia, como Espírito, entre nós outros, os moradores do prédio novo, ao passo que, se se deitava na sua velha esteira, eu o distinguia deitado no soalho do próprio quarto de dormir de C. 

A verdade era que, tal fora a série de sofrimentos físicos que atingira o chamado Pedro, quando homem, que, agora, traumatizadas a sua mente e respectivas vibrações, transportara para o  perispírito os complexos do estado de encarnação, conservando, por isso mesmo, as aparências da antiga enfermidade e os sofrimentos outrora experimentados.

Tudo indicava que ele, Pedro, vivera pobremente, do produto da sua pequena horta, e que mais tarde, advindo a enfermidade inclemente, tornara-­se miserável, assim morrendo à míngua de recursos. Tratava-­se, como se vê, de um pobre ser assaz ignorante e não propriamente mau, mas difícil de se convencer do estado anormal em que vivia, dado, realmente, a sua pequena capacidade de compreensão das coisas. 

Lembro-­me ainda de que, da primeira vez que me defrontei com a entidade em questão, de modo a poder falar-­lhe:

Bom dia, Pedrinho, como tem passado você? 

Bom dia, Sinhá... Vai-­se indo com a graça de Deus... Não ando bom nem nada, Sinhá, como a Senhora vê, estou cada vez pior...

É, vejo que você não está muito bem mesmo... E trabalhando assim... Quer que eu o ajude a amarrar as ervilhas às estacas? Você está um pouco fraco, Pedrinho, esse serviço é penoso para uma pessoa nas suas condições... e assim você se cansará cada vez mais... 

- Tenho muitas dores no corpo e não consigo mais me alimentar­. 

- E você chegou a orar para Jesus, Pedrinho? Jesus está sempre pronto a auxiliar os necessitados. Ele curou cegos, paralíticos, leprosos. 

Ah, Sinhá! Se eu vivesse no tempo dele, não é verdade que ele me curaria dessa minha doença também?

O tempo é sempre o mesmo, Pedrinho, o Divino Mestre não nos abandonou, e estou certa de que há de curar também a sua doença... A sua cura já começou, meu irmãozinho, e dentro em breve você não sentirá mais nada do que vem sofrendo, estará fortalecido e feliz, para conquistar o futuro. 

_ E mesmo depois da morte, Jesus continua ajudando a todos os que precisam. 

Deus permita que seja assim mesmo, porque eu tenho muito medo de ir para o inferno, quando morrer... 

Quer um médico para se consultar, Pedrinho? Essa doença não vale nada, isso é apenas o seu pensamento, que recorda o tempo em que a doença existiu, fazendo você sofrer novamente... Contudo, ainda assim, você precisa de certo tratamento para a enfermidade da alma, pois é a sua alma que está doente... Será melhor você ir para um hospital, porque lá haverá conforto, tratamento adequado, enfermeiros para atendê-­lo, além dos médicos, e tudo será gratuito. Se você quiser, arranjarei sua entrada num hospital muito bom, que eu conheço... 

—  Eu quero ir para um hospital, sim, a questão é encontrar uma pessoa para tratar das minhas galinhas e das minhas plantas... Não posso ir porque, além de tudo, preciso refazer minha hortinha para ganhar alguma coisa, não posso continuar nessa miséria...

Ora, em primeiro lugar está a sua saúde, porque doente ninguém pode trabalhar... Eu tomarei conta de tudo, para você poder ir... Acaso você não confia em mim? pois, conforme você sabe, eu também gosto de criar galinhas, até já possuí grande criação de galinhas... e também gosto de tratar de plantas... 

_ Você então não tem fé em Deus? Vamos orar, para que o Senhor nos ajude... Tudo há de melhorar para você, tenhamos um pouquinho mais de paciência... 

—  Sim, minha Sinhá, eu tenho fé em Deus, sim Senhora... Deus Nosso Senhor até é muito bom, na verdade e não sei como agradecer tanta bondade que tenho recebido dele... Não vê a Senhora, minha Sinhá, que, se eu estou sofrendo tanto assim, também tenho quem me ajude muito, graças a Deus... O culpado da minha desgraça foi o seu Romano. A Senhora conhece o seu Romano?

Não, Pedrinho, não conheço, não...

—  Pois ele é o vendeiro dali, da rua de cima, um (italiano) muito “inzigente” e “ambicioneiro”... Eu  tinha uns negócios com ele, quer dizer, comprava no armazém dele os “mantimentos” para mim, o milho para as galinhas, que era bem pouco, porque elas pastavam bem, o querosene para a candeia, o carvão para cozinhar e o sabão para lavar a minha roupa, os pratos e as panelas. Mas depois eu adoeci, fiquei ruim como a Senhora não imagina, não pude trabalhar mais, não ganhei nada, pois como era que eu havia de bater enxada e sair por aí vendendo as verduras, com a febre que me atacou? Fiquei três meses muito mal, sim Senhora, mas continuei comprando no armazém do seu Romano. Pois então eu havia de passar fome? E as galinhas então não precisavam do milho? Mas, não pude pagar nada disso com pressa. Então, minha Sinhá, foi que o “seu” Romano me fez uma traição tão grande que me deixou na miséria que a Senhora vê...

—  Não pense mais nisso, Pedrinho!  O que passou não mais deve ser comentado. Lembrando-­se desse triste passado, você se martiriza novamente, sem razão de ser, e piora do seu estado geral... Pense antes em Deus e no futuro e peça forças para esquecer o mau  passado e começar vida nova, que será muito melhor do que essa, que tanto o fez sofrer... 

Mas é que a traição foi grande, minha “dona”, eu quero que a Senhora saiba de tudo, porque até hoje o meu coração sangra... Isso “já foi” há muito tempo, não sei mais há quantos anos, não Senhora... Mas agora “já vou” melhorando de vida, graças a Deus. Estou bem aliviado das minhas dores e posso trabalhar um pouquinho... Faltam as ferramentas para revirar a terra, minha enxada, meu ancinho, minha pá, meu machado... O que seu Romano fez comigo não se faz com um cachorro, fique a Senhora sabendo... Eu também sou gente, ou não sou? Então porque sou negro não sou gente? Só ele é que é gente, porque é alvo? Ele veio aqui, eu estava deitado na minha cama, tiritando com o frio da febre. Ele me tirou da cama, fez-­me deitar numa esteira velha, dizendo que ela era mais fresca e boa para a saúde do que a cama; carregou minha cama, meu colchão, minhas “cobertas”, minha mesa, meu armário, minhas cadeiras e meus bancos, pois eu tinha a casa muito  arrumadinha porque estava viúvo  “de pouco tempo”; carregou  meu  baú  de roupa, minhas panelas e meus pratos e minhas latas, carregou  até minhas abóboras e minhas couves, sim Senhora, ele fez isso!  carregou os quiabos, os gilós, os cheiros verdes, as ervilhas! Nem as galinhas, nem meus galos de briga e os ovos escaparam da ladronice dele, e levou até as minhas ferramentas, tudo para pagar a tal dívida. Então eu devia tanto assim a Seu Romano? Foi ou não foi ladronice dele? Mas eu ia pagar a dívida, sim Senhora, a questão era eu ficar bom para poder trabalhar e ganhar o dinheiro. Não era preciso ele fazer isso, não é mesmo? Só ficou aquela esteira velha, acolá... porque mesmo o travesseiro foi a vizinha aí do lado que me favoreceu, por bondade. Os vizinhos pediram a «seu» Romano para não fazer essa maldade comigo, mas ele respondeu com má ­criação, dizendo que ia chamar a polícia para me levar para um hospital, que eu devia muito a ele e ele não podia perder... mesmo porque eu não ficaria bom, mesmo, nunca mais, ia morrer, e, antes que outra pessoa arrecadasse o que era meu, arrecadava ele, a quem eu devia muito... A Senhora já viu coisa igual na sua vida? Ah, eu chorei muito, e então foi que fiquei sem recursos para poder trabalhar, piorei muito da minha doença devido ao desgosto sofrido, e até hoje estou assim... e se não fosse a bondade das minhas vizinhas eu até teria morrido de fome, elas é que me traziam a comida, fiquei vivendo de esmolas, minha Sinhá... 

Entregue seu desgosto a Deus, Pedrinho, e não pense mais nisso, para você conseguir a paz do coração. Mais possui Deus para conceder a você do que «seu» Romano teve para levar daqui. Ele é mais infeliz do que você, pois, praticando tal violência, em vez de observar os deveres da Fraternidade para com o próximo, saiu da graça de Deus, enquanto que se você perdoar estará na mesma graça. Não se lembra da resposta de Jesus, quando o apóstolo perguntou quantas vezes deveria perdoar ao ofensor? Jesus respondeu: Perdoa até setenta vezes sete... isto é, perdoa sempre... O melhor é você concordar em ir para o hospital a fim de se restabelecer e poder trabalhar nos serviços de Deus... e não mais com a enxada nas mãos... 

Que Deus Nosso Senhor perdoe a ele e a mim ....... Para dizer a verdade, minha Sinhá, eu já odiei seu Romano muito mais do que odeio agora. Mas no princípio senti um ódio por ele que, se pudesse, eu o teria devorado vivinho... Fiz até um “trabalhinho” com fogo e pólvora, para ver se ele devolvia o que era meu. Quis pôr «um mal» nele, para me vingar. Mas qual!  Seu Romano parece até o próprio “manhoso”. Tem o “corpo fechado” a sete trancas, sim Senhora, não pegou nada nele, minha Sinhá, perdi o tempo, piorei da saúde porque me levantei e abusei sem poder, e ainda gastei o último dinheirinho que tinha, para comprar os apetrechos... 

Nisso você fez mal, Pedrinho, porque, desejando o pior para o próximo, você saiu da graça de Deus e se aliou ao Espírito das trevas. A lei de Deus recomenda perdoar e esquecer as ofensas, e Jesus Cristo, nosso Mestre, aconselha­-nos a amar os próprios inimigos, sem jamais desejar ­lhes qualquer mal. Não devemos, portanto, exercer vinganças, seja contra quem for. Deus, nosso Pai, é o único que saberá e poderá corrigir com justiça as nossas faltas. Perdoe, pois, a seu Romano e vá sossegado para o hospital, porque eu garanto que dentro em breve você estará forte e alegre para o trabalho que Deus confiar às suas forças. 

Inesperadamente, apareceu entre nós a figura amável de homem negro apresentando­-se como comprador de imóveis:

—  Desejo comprar, sim, um terreno por estas imediações, e, dentre alguns que sei estarem à venda, o seu é o que mais me convém, pela proximidade da Estação da Estrada de Ferro. A você, meu amigo, conviria muito o negócio. Está doente, e assim não poderá trabalhar para desenvolver sua lavourazinha, porque não tem saúde nem recursos e por isso sofre dificuldades sem fim. Venda, pois, o terreno, eu  compro e pago à vista... depois trataremos da escritura... Coloque o dinheiro no Banco, vá para o hospital tratar­-se... e ao  restabelecer­-se, deixando o hospital, terá uma quantia razoável para comprar outra propriedade maior e melhor do que esta, e tocar a lavourazinha... Afinal, sou seu  amigo e o aconselho bem... Somos da mesma raça, da mesma cor. Nossas avós e nossas mães foram escravas, choraram e gemeram no cativeiro, e isso nos deve unir... E esteja certo, amigo Pedro, que em mim você terá um irmão leal ao seu dispor, para protegê­-lo e defendê-­lo de hoje em diante... Suas infelicidades passaram, confie em Deus e nada receie...

_ A senhora acha que deve vender meu terreninho?

_ Com certeza, Pedrinho! Você não pode perder essa oportunidade. Aceite a oferta e vai com ele ao médico. 

—  Deus Nosso Senhor é muito bom, na verdade, e Jesus Cristo é o nosso  Mestre e Protetor, conforme explicou  a minha Sinhá... Seu  Romano foi que me fez uma traição muito grande, mas agora, vejam só, encontro gente boa para me ajudar. O que «seu» Romano me fez não se faz com um bicho... 

Esqueça o passado, Pedrinho, esqueça e perdoe, para Deus perdoar também as suas faltas. Agora pense no futuro para recuperar o tempo perdido nas trevas do ódio... E vá com Deus... 

Não respondeu  e saiu  naturalmente, pela porta da rua. 

Imbira” — fibra de casca de árvores, verdes, usada pelos homens da lavoura como amarrilho para os seus serviços. 

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