quarta-feira, 24 de novembro de 2021

Lei de Justiça

 Casa Espírita Missionários da Luz – Mocidade > 14 anos – 19/11/2021

Estudo Virtual Google Meet

Tema: Lei de Justiça

Objetivos:

  • Perceber que todos os homens possuem o sentimento de justiça e que o progresso moral desenvolve esse sentimento;

  • Entender justiça como cada um respeitar os direitos dos demais;

  • Refletir sobre a base da justiça, segundo a lei natural, conforme o ensino de Jesus: “Queira cada um para os outros o que quereria para si mesmo.";

  • Refletir que a Justiça de Deus abrange aspectos da vida que as leis sociais não contemplam, pois são do âmbito do tribunal da consciência.


Bibliografia:

O Livro dos Espíritos, Cap. XI, 3ªParte: Pergs. 873 à 879;

Evang.Seg.Espiritismo, Cap XI “Amar ao Próximo como a si mesmo”, itens 1 à 4;

NT, Lucas, 8:1-8 (parábola do juiz injusto);

Libertação, André Luiz/Chico Xavier, caps. 10 e 13 (estudo de caso).

https://www.passatempoespirita.com.br/aulas/aula-121-parabola-do-juiz-iniquo-justica-divina/

Material – Formulário Google de pesquisa de opinião:
https://forms.gle/HyMEvgpHajmtpgS6A

Desenvolvimento:

  1. Hora da novidade, exercícios de respiração lenta e profunda, e prece inicial.

  1. Motivação Inicial:

Colar o link da pesquisa de opinião no chat da sala virtual.

As perguntas são:

  • Você se considera uma pessoa justa?

  • Qual critério você usa para saber se está fazendo justiça?

  • Esse critério está de acordo com a lei de Deus?

  • Qual a base da justiça segundo a lei divina?


  1. Desenvolvimento

Compartilhar a tela com o resultado da pesquisa, sem comentar as respostas.


Vamos ver a resposta de acordo com o LE, na 3a.parte, Das Leis Morais, onde Kardec tratou da Lei de Justiça, Amor e Caridade

875.Como se pode definir a justiça?

A justiça consiste em cada um respeitar os direitos dos demais.”

Interessante a gente pensar: respeitamos os direitos dos outros ao pensar que agirmos com justiça?

Vocês pensaram em alguma situação específica?

Proposta ao grupo de condução da reflexão:

- fazer uma roda de conversa, onde escolhemos em cada ponto, um de vocês para colocar sua ideia sobre o ponto em discussão, ok?

Como podemos saber quais são os direitos dos outros? O que acham? (sortear um jovem para responder)

Depois das respostas deles, acrescentar que na 873a, temos:

Que é o que determina esses direitos?

-A lei dos Homens e lei de Deus

Qual a diferença entre essas duas leis? Quem pode dar um exemplo? (sortear um jovem para responder)

(pena de morte, aborto, escravidão, etc.: podem ser legais numa sociedade mas são crimes perante a lei divina)

Depois complementar com a resposta da 873a:

- A lei dos homens varia de acordo com o desenvolvimento da civilização. “Nem sempre, pois, é acorde com a justiça o direito que os homens estabelecem.”

(sortear um jovem para responder)

E tem outro ponto: as nossas leis abrangem todos os aspectos da vida? Ou seja, tem alguma coisa que a gente pode fazer que as nossas leis não abrangem?

Se sim, quem dá um exemplo?

==> Quando eu como demais, ou não busco comer alimentos saudáveis, ou costumo beber bebidas alcoólicas, ou não cuido da minha higiene pessoal, ou não faço exercícios físicos regulares, etc, estou prejudicando meu corpo físico.

É contra as nossas leis? Não! É contra a lei natural? SIM!!!

Como os Espíritos responderam a Kardec:

Ademais, este direito regula apenas algumas relações sociais, quando é certo que, na vida particular, há uma imensidade de atos unicamente da alçada do tribunal da consciência.” (873a)


Exemplo de ensino de Jesus, que Kardec colocou no Cap. IX, Bem-aventurados os brandos e pacíficos, item 3:

Sabeis que foi dito aos antigos: Não matareis e quem quer que mate merecerá condenação pelo juízo. – Eu, porém, vos digo que quem quer que se puser em cólera contra seu irmão merecerá condenação no juízo; que aquele que disser a seu irmão: Raca, merecerá condenado pelo conselho; e que aquele que lhe disser: És louco, merecerá condenado ao fogo do inferno. (S. MATEUS, 5:21 e 22.)


==>
somos responsáveis pelos pensamentos! Podemos agir em desacordo com as leis de Deus pelos pensamentos! Podemos prejudicar a nós próprios, ou a nossos familiares, amigos, sem cometer crime perante as nossas leis.

Então, a Justiça de Deus abrange todos os aspectos de nossas vidas!


  • Qual então, no relacionamento com os outros, a base da justiça segundo a lei divina? (sortear um jovem para responder)

876. Posto de parte o direito que a lei humana consagra, qual a base da justiça, segundo a lei natural?
Disse o Cristo: Queira cada um para os outros o que quereria para si mesmo. No coração do homem imprimiu Deus a regra da verdadeira justiça, fazendo que cada um deseje ver respeitados os seus direitos. Na incerteza de como deva proceder com o seu semelhante, em dada circunstância, trate o homem de saber como quereria que com ele procedessem, em circunstância idêntica. Guia mais seguro do que a própria consciência não lhe podia Deus haver dado.”

==> Voltando às respostas dadas na pesquisa: alguém responderia diferente depois dessas nossas reflexões?

(sortear um jovem para responder)

E com relação às injustiças, porque vemos tantas injustiças no mundo?

Como vimos na 873a: Nem sempre, pois, é acorde com a justiça o direito que os homens estabelecem.”

==> como nós somos falhos, imperfeitos, as nossas leis também são, e mesmo nós, avaliamos as questões de forma equivocada porque o egoísmo entra no julgamento que fazemos dos outros.

(sortear um jovem para responder)

Existem então pessoas injustiçadas perante a lei divina?

==> Não! Existem injustiças pela imperfeição de nossas leis, mas não pela lei de Deus.

(sortear um jovem para responder)

Como podemos entender essas injustiças que vemos, perante a lei de Deus?


==> Por outra lei divina: Lei de Liberdade! Livre arbítrio e responsabilidade. Plantamos de forma livre, mas colhemos de acordo com o que plantamos.

Se agimos de forma errada (plantamos) numa encarnação, a colheita, que virá com certeza, pode ser em outra existência.


(sortear um jovem para responder)

O que fazer quando somos injustiçados, e não temos recursos para desfazer a injustiça?

==> orar e confiar que a Justiça de Deus está sempre agindo!

Deus é Justo e BOM!! Infinitamente Justo e Bom! Então, manter a fé, e aceitar, se resignar quando a situação está além de nossa capacidade de ação!

  1. Fixação do Conteúdo:

Vamos ver uma parábola de Jesus, que está em Lucas, 8:1-8:

E contou-lhes também uma parábola sobre o dever de orar sempre, e nunca desfalecer,

Dizendo: Havia numa cidade um certo juiz, que nem a Deus temia, nem respeitava o homem.

Havia também, naquela mesma cidade, uma certa viúva, que ia ter com ele, dizendo: Faze-me justiça contra o meu adversário.

E por algum tempo não quis atendê-la; mas depois disse consigo: Ainda que não temo a Deus, nem respeito os homens, todavia, como esta viúva me molesta, hei de fazer-lhe justiça, para que enfim não volte, e me importune muito.

E disse o Senhor: Ouvi o que diz o injusto juiz. E Deus não fará justiça aos seus escolhidos, que clamam a ele de dia e de noite, ainda que tardio para com eles?

Digo-vos que depressa lhes fará justiça...

==> era uma viúva injustiçada pelo adversário dela, que não tinha outra opção a não ser apelar para o juiz. E o juiz, detinha o poder da lei, mas não era honesto, reto, justo. Acabou fazendo justiça no caso dela, por interesse próprio: para não ser mais importunado por ela.

Como podemos entender esse ensino de Jesus? (sortear um jovem para responder)

==> Jesus nos mostra nessa parábola, que a justiça divina sempre se faz presente! Pode demorar, mas não falha! Precisamos ter persistência (a viúva não desistiu de ir lá fazer sua petição), orando e confiando no Juiz Maior que é Deus!

Estudo de caso: (relatado por André Luiz, em Libertação)

Vamos ver um caso onde vemos a Justiça de Deus e a dos homens, agindo.

No século XIX, um homem era proprietário de extensa faixa de terra e se orgulhava da posição de senhor de dezenas de escravos. 

Jorge era um dos escravos desse homem, embora tivesse nascido quase sob o mesmo teto. Era escravo e irmão consanguíneo, embora de outra mãe, também escrava. 
O homem nunca aceitou esse fato, considerando ultraje ao nome familiar. 

Ambos se tornaram pais; ele teve um filho e Jorge, uma filha. 
O filho do rico ultrajou a filha do escravo e, quando semelhante amargura sobreveio, com escárnio supremo para um lar cativo e triste, o homem tomou medidas condenáveis que culminaram no desespero de Jorge. Ele, desarvorado e semilouco, não somente matou o filho rico do homem, como se suicidou logo depois em dramáticas circunstâncias.

==> O que vemos nessa história real, de um passado não tão distante assim: a escravidão era legal perante as leis da época. Vemos então um drama se desenrolando, em âmbito de relações afetivas/sexuais, que gerou graves consequências: assassinato e suicídio.

100 anos depois, esses Espíritos estão novamente reencarnados, em contato, pela necessidade de reajuste dos dramas do passado.

Jorge era agora, um operário em rude serviço braçal, mal conseguia sustentar dignamente a casa, cuidando da mãe, viúva. 

Ainda assim, Jorge se casou muito cedo, com uma colega de trabalho e teve uma filhinha. 
A vida corria com muitas dificuldades para o lar subalimentado e desprotegido, quando certo crime, constituído de roubo e assassínio, sobreveio na organização em que Jorge trabalhava, e toda a culpa, em face de circunstâncias inextricáveis, recaiu sobre ele. 

Foi para prisão e, sem qualquer recurso para ampará-lo nos interrogatórios a que foi submetido. 
O verdadeiro criminoso que, desfrutava de posição social invejável, nunca foi conhecido pela justiça. 
Jorge sofreu todo gênero de sofrimentos morais e físicos, castigado por um crime que não cometeu. 
Jorge recebeu dolorosa pena, e quando seu corpo vacilava sob maus tratos, sua esposa, conturbada pela necessidade e pelo infortúnio, esqueceu as obrigações de mãe, e se suicidou. 
Torturada por tantas aflições, a mãe de Jorge desencarnou num catre de indigência. 

A filha de Jorge, moça pobre, sem família, é empregada doméstica na casa do mesmo juiz que condenou Jorge pelo crime. 
Esse juiz tem um filho, um pouco mais velho que a moça, e a está assediando, às escondidas da família. 

O desventurado Jorge não resistiu a todos essas dores que envolveu sua família, perturbou-se e enlouqueceu no cárcere, sendo transferido da cela úmida para misérrimo hospício, onde mais se assemelha a um animal encurralado.

==> Que situação dramática dessa família pobre!

Considerando as leis divinas, a justiça de Deus que não falha, como podemos ver a ligação desses personagens dessas duas encarnações? ==> deixar que tentem associar os dramas do século XIX com esse do século XX.

Esse juiz, é o homem rico do século XIX reencarnado. Como teve oportunidade de acolher e ajudar na encarnação do passado e não fez, veio agora com o compromisso de ajudar a Jorge e sua filha.

Vemos que a lei de atração, para o cumprimento dos objetivos reencarnatórios, colocou a moça, filha de Jorge, como doméstica na casa do juiz, para reunião novamente desses Espíritos.

O Filho rico foi leviano, abusando da posição de jovem mulher indefesa e escrava do passado, e foi assassinado por essa conduta.

Nessa encarnação de agora, veio com o compromisso de acolher, respeitar e casar com a mesma jovem que ultrajou antes.

E Jorge, revoltado com a injustiça recebida, se tornou assassino e suicida. Com o erro judiciário dessa nova existência, expiou o crime cometido antes

O juiz, após esse apoio do mentor, que o fez recordar-se dos compromissos anteriores, iria acolher a jovem empregada como protegida sua, como uma filha, ia rever o processo criminal que condenou Jorge e passaria a ser protetor dele e de sua filha.

Vemos que mesmo na injustiça humana, a Justiça divina está em ação, sempre!

  1. Exercício de respiração profunda e pausada, e prece final.

  1. Avaliação

Encontro para 4 jovens com boa participação. 

Não cheguei a falar da parábola; somente do caso relatado por AL.

  1. Anexos

Justiça e direitos naturais.

Livro dos Espíritos:

873. O sentimento da justiça está na natureza, ou é resultado de ideias adquiridas?
“Está de tal modo na natureza, que vos revoltais à simples ideia de uma injustiça. É fora de dúvida que o progresso
moral desenvolve esse sentimento, mas não o dá. Deus o pôs no coração do homem. Daí vem que, frequentemente, em homens simples e incultos se vos deparam noções mais exatas da justiça do que nos que possuem grande cabedal de saber.”

a) —Que é o que determina esses direitos?

Duas coisas: a lei humana e a lei natural. Tendo os homens formulado leis apropriadas a seus costumes e caracteres, elas estabeleceram direitos que podem ter variado, com o progresso das luzes. Vede se hoje as vossas leis, sem serem perfeitas, consagram os mesmos direitos que as da Idade Média. Entretanto, esses direitos antiquados, que agora se vos afiguram monstruosos, pareciam justos e naturais naquela época. Nem sempre, pois, é acorde com a justiça o direito que os homens estabelecem. Ademais, este direito regula apenas algumas relações sociais, quando é certo que, na vida particular, há uma imensidade de atos unicamente da alçada do tribunal da consciência.”

876. Posto de parte o direito que a lei humana consagra, qual a base da justiça, segundo a lei natural?
Disse o Cristo: Queira cada um para os outros o que quereria para si mesmo. No coração do homem imprimiu Deus a regra da verdadeira justiça, fazendo que cada um deseje ver respeitados os seus direitos. Na incerteza de como deva proceder com o seu semelhante, em dada circunstância, trate o homem de saber como quereria que com ele procedessem, em circunstância idêntica. Guia mais seguro do que a própria consciência não lhe podia Deus haver dado.”

Efetivamente, o critério da verdadeira justiça está em querer cada um para os outros o que para si mesmo quereria, e não em querer para si o que quereria para os outros, o que absolutamente não é a mesma coisa. Não sendo natural que haja quem deseje o mal para si, desde que cada um tome por modelo o seu desejo pessoal, é evidente que nunca ninguém desejará para o seu semelhante senão o bem. Em todos os tempos e sob o império de todas as crenças, sempre o homem se esforçou para que prevalecesse o seu direito pessoal. A sublimidade da religião cristã está em que ela tomou o direito pessoal por base do direito do próximo.

Libertação, André Luiz/Chico Xavier

Cap.10 – Em Aprendizado

Saldanha, espírito obsessor de Margarida, conta a razão de sua vingança ao mentor espiritual:

Não propriamente a ela, mas ao pai, juiz sem alma que me devastou o lar. Faz onze anos, precisamente, que a sentença cruel de um magistrado caiu sobre os meus descendentes, exterminando-os...

Tão logo abandonei o corpo físico, premido por uma tuberculose galopante, revoltado com a pobreza que me lançara à extrema penúria, não pude afastar-me do ambiente doméstico. Minha infortunada Iracema herdou-me um filho querido, a quem não pude legar qualquer recurso apreciável. Jorge e sua genitora passaram, desse modo, a enfrentar dificuldades e aflições que não posso relembrar sem imensa angústia. Operário em rude serviço braçal, meu filho não conseguia sustentar dignamente a casa, definhando-se-lhe a mãezinha em padecimentos continuados e sofridos em silêncio. Ainda assim, Jorge contraiu núpcias, muito cedo, com uma colega de trabalho, que, a seu turno, lhe deu uma filhinha atormentada e sofredora. A vida corria desesperadamente para o lar subalimentado e desprotegido, quando certo crime, constituído de roubo e assassínio, sobreveio na organização em que meu desventurado rapaz trabalhava, e toda a culpa, em face de circunstâncias inextricáveis, recaiu sobre ele. Acompanhei-lhe a prisão imerecida e, sem qualquer recurso para ampará-lo, segui os interrogatórios infernais a que foi submetido, como se fora homicida vulgar. (...) Assisti, por isto, com indescritível terror, aos detestáveis acontecimentos. Humilhado, na minha condição de homem invisível para os encarnados, visitei chefias e repartições, autoridades e guardas, tentando encontrar alguém que me auxiliasse a salvar Jorge, inocente. Identifiquei o verdadeiro criminoso que, ainda agora, desfruta posição social invejável e tudo fiz, sem resultado, por clarear o processo oprobrioso. Meu filho sofreu todo o gênero de atrocidades morais e físicas, castigado por um delito que não cometeu. (...)

Descrever-lhe o que foi minha dor é alguma coisa de impraticável à capacidade verbal. Jorge recebeu dolorosa pena, quando seu corpo vacilava sob maus tratos, e Irene, minha nora, conturbada pela necessidade e pelo infortúnio, esqueceu as obrigações de mãe, suicidando-se (…) Torturada pelos sucessos aflitivos, minha esposa desencarnou num catre de indigência, (...). Minha neta, hoje menina e moça, mas ameaçada por incerto porvir, atende a serviço doméstico, aqui mesmo nesta casa, onde tresloucado irmão de Margarida procura arrastá-la sutilmente a grave desvio moral. (…)

Meu desventurado Jorge, (...), não resistiu e perturbou-se. Enlouquecendo no cárcere, foi transferido da cela úmida para misérrimo hospício, onde mais se assemelha a um animal encurralado. (…)


Cap. 13 – Convocação Familiar

(Juiz rememora os fatos relativos ao processo criminal de Jorge)

– “Por que razão se detinha – meditava o pai de Margarida – naquele processo liquidado, a seu ver, desde muito, ferindo o próprio coração? Anos haviam transcorrido sobre o crime obscuro, entretanto, o assunto lhe revivia na cabeça, qual se a memória lho impusesse, tirânica e desapiedada, por disco de estranho padecimento moral. Que motivos o levavam a rememorar semelhante peça judiciária com tanta força? Via Jorge, mentalmente, esquecido no abismo da inconsciência e lembrava-lhe as palavras veementes, afirmando inocência. Não conseguia explicar por que fortes razões lhe recolhera a filha, introduzindo-a no próprio lar. (...)

Recordou que o sentenciado perdera a assistência dos melhores amigos e a própria esposa suicidara-se em pleno desespero... No entanto, porque reter-se naquele caso sem importância? Ele, o juiz, chamado a processos incontáveis, apreciara enigmas muito mais intrincados e importantes. Não conseguia, pois, justificar-se, quanto às reminiscências do humilde condenado, réu de crime comum…” (…) 

(Em desdobramento pelo sono, o juiz conversa com o mentor espiritual sobre o caso de Jorge)

Mas, eu fui o juiz da causa. Consultei os códigos necessários, antes de emitir a sentença. O crime foi averiguado, os laudos periciais e as testemunhas condenaram o réu. (…)


Ele é, então, inocente? – indagou o interlocutor, exigindo bases sólidas a futuras conclusões.

Ninguém sofre sem necessidade à frente da Justiça Celeste e tão grande harmonia rege o Universo que os nossos próprios males se transubstanciam em bênçãos. Explicaremos tudo. (…)


Já te auscultei, no entanto, os arquivos mentais e vejo os quadros que o tempo não destrói. No século findo, guardavas o título de posse sobre extensa faixa de terra e orgulhavas-te da posição de senhor de dezenas de escravos que, em maioria reencarnados, atualmente te integram a falange de colaboradores nos trabalhos comuns a que te sentes constrangido pela máquina funcional. A todos eles, deves assistência e carinho, auxílio e compreensão. Nem todos os servos do passado, porém, se confundem no mesmo naipe de relações com o teu espírito.

Alguns se salientaram no drama que viveste e volvem ao teu caminho, impressionando-te o coração. Jorge de hoje era ontem teu escravo, embora nascesse quase sob o mesmo teto que te assinalou os primeiros vagidos. Era teu servidor, perante os códigos terrestres, e irmão consangüíneo, ante as divinas leis, não obstante afagado por outra mãe. Nunca lhe perdoaste semelhante aproximação, considerada em tua casa por aviltante ultraje ao nome familiar. Chegados ambos à tarefa da paternidade, teu filho de ontem e de hoje lhe transviou a filha do pretérito e de agora e, quando semelhante amargura sobreveio, com escárnio supremo para um lar cativo e triste, determinaste medidas condenáveis que culminaram no insofreável desespero de Jorge em outros tempos, o qual, desarvorado e semilouco, não somente roubou a vida ao corpo de teu filho que lhe invadira o santuário doméstico, mas também a própria existência, suicidando-se em dramáticas circunstâncias.

Todavia, nem a dor, nem a morte apagam as aflições da responsabilidade que só o regresso à oportunidade de reconciliação consegue remediar. E aqui te encontras, de novo, diante do condenado, junto do qual sempre te inclinaste à antipatia gratuita, e ao lado da jovem a quem prometeste amparar por filha muito querida ao coração. Trabalha, meu amigo! Vale-te dos anos, porque Alencar e tua pupila serão atraídos à bênção do matrimônio.

Age enquanto podes. Todo bem praticado felicitará a ti mesmo, porquanto outro caminho para Deus não existe, fora do entendimento construtivo, da bondade ativa, do perdão redentor.

Jorge, humilhado e desiludido, apagou o desvario deplorável, suportando inominável martírio moral em poucos anos de acusação indébita e prisão tormentosa, com viuvez, enfermidades e privações de toda a espécie. (...)


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