Casa Espírita Missionários da Luz – Mocidade – 08/11/2024
Tema: Vícios Modernos - – Parábola do Semeador
Objetivos:
- Refletir sobre os vícios da atualidade, como ilusões que desviam o Espírito encarnado do caminho evolutivo;
- Estudar a parábola do semeador.
Bibliografia:
O Livro dos Espíritos, 3ª parte, cap. V - Lei de Conservação, pergs 705, 706, 711, 712, 715; 4ª.parte perg 893 à 895 (As Virtudes e os Vícios)
O Evangelho, Cap. XVII – Sede Perfeitos, itens 5 e 6 (Parábola do Semeador), item 10 (O homem no mundo);
Espelhos da Alma, Cap 8, item “As Ilusões Humanas” - pág 210;
O Homem Integral, Joanna de Angelis/ Divaldo Franco, Cap. 1.
Material: ESE e livro Espelhos da Alma; Nuvem de Palavras (Mentimeter); notebook pra mostrar a nuvem de palavras formada.
Desenvolvimento:
1. Hora da novidade e Prece Inicial
2. Motivação Inicial:
Contar a história de Ulisses, da mitologia grega, quando retornava para casa, após a guerra de Troia e precisa passar pelo local onde há o canto das sereias, conforme relatado em Espelhos da Alma nas pág 210 e 211 (em anexo).
- O que representa nesse mito, o canto das sereias?
“Psicologicamente, representam as ilusões, os desejos e as paixões humanas, que vividos em excesso tornam-se forças autodestrutivas.”
==> são ilusões, são vícios que nos desviam do caminho da nossa evolução espiritual.
- Momento de reflexão: vou passar um link de uma nuvem de palavras, para que cada um de vocês identifique, atualmente, como sendo o canto da sereia em sua vida, ok?
Segue o link pra resposta: https://www.menti.com/6ff8t8hzor
==> exibir o resultado da nuvem de palavras com as respostas do grupo:
- São realmente muitas as ilusões do mundo que se não estivermos atentos, podemos ser totalmente envolvidos e nos afastamos do nosso EU, espírito imortal que somos, em experiência reencarnatória para nossa evolução espiritual.
- O que é uma ilusão?
==> algo que nos empolga, nos fascina e que achamos, com veemência, que é muuuito necessário para nós; irresistível!
==> e esse algo é, de fato, bom para nós? Não! Nos impede de seguirmos o caminho que nos está destinado, ou nos retarda nesse caminho. No caso de Ulisses, a volta para casa; no nosso caso, a evolução.
3. Desenvolvimento
Jesus nos contou uma parábola onde entre outras situações, nos simbolizou as ilusões do mundo nos distanciando das leis divinas, dos ensinos de Jesus. Quem lembra dessa parábola? Ele contou essa parábola e depois, junto aos discípulos, ele explicou o significado dela.
==> quem lembra que parábola é essa e qual sua interpretação?
- Entregar o ESE, cap. XVII item 5 para ler só a parábola (não ler a explicação).
Como vocês entendem esse ensino de Jesus?
- o que é a semente? ==> os ensinos de Jesus
- pra quê precisamos dessa semente? ==> para não nos esquecermos de nossa natureza espiritual e de nosso objetivo aqui na Terra…
==> lembrar a fábula do príncipe que virou um sapo: de tanto ficar no brejo, com outros sapos, comendo, mergulhando, vivendo como sapo, se esquece que é um príncipe!
==> a semente germinando em nosso mundo íntimo nos mantém atentos à nossa realidade de príncipes e não a “aparência” momentânea de sapo...
- Como podemos interpretar esses tipos de solo (nosso mundo íntimo)?
Qual o 1º tipo? A daqueles que “uma parte da semente caiu ao longo do caminho e os pássaros do céu vieram e a comeram”….
– Quem quer que escuta a palavra do reino e não lhe dá atenção, vem o espírito maligno e tira o que lhe fora semeado no coração. Esse é o que recebeu a semente ao longo do caminho.
==> quem são esses que ouviram e não prestaram atenção? - todos os que vivem a vida exclusivamente material: só se preocupam com a vida aqui encarnada. Não identificam nem tentam transformar seus vícios em virtudes, não se preocupam com os outros; ambicionam o “se dar bem na vida”; curtir a vida. São só materialistas, né?
Qual o 2º tipo?
– Aquele que recebe a semente em meio das pedras é o que escuta a palavra e que a recebe com alegria no primeiro momento. – Mas, não tendo nele raízes, dura apenas algum tempo. Em sobrevindo reveses e perseguições por causa da palavra, tira ele daí motivo de escândalo e de queda.
==> quem são esses? - todos nós que nos encantamos com a msg de Jesus, mas com as dificuldades, os estresses, as cobranças e responsabilidades do mundo, nos deixamos levar pelos cantos das sereias… Não aprofundamos a semente… não se consolidou em nós a convicção do ensino de Jesus, das leis de Deus...
Qual o 3º tipo?
– Aquele que recebe a semente entre espinheiros é o que ouve a palavra; mas, em quem, logo, os cuidados deste século e a ilusão das riquezas abafam aquela palavra e a tornam infrutífera.
==> esses são todos nós que conhecemos o Evangelho, mas nos deixamos levar pelos apelos do mundo, pelo ter em detrimento do ser. Diferente do solo pedregoso, que não deu atenção ao Evangelho, o solo do espinheiro simboliza os que conhecem o Evangelho, sabem de seu valor, acreditam em Deus, mas vivem como os materialistas. Se deixam levar pelos cantos das sereias do mundo...
Qual o 4º tipo?
– Aquele, porém, que recebe a semente em boa terra é o que escuta a palavra, que lhe presta atenção e em quem ela produz frutos, dando cem ou sessenta, ou trinta por um. (S. MATEUS, 13:18 a 23.)
==> porque será que na boa terra, a produção não foi igual para todos?
- porque estamos em condições diferenciadas; como diz a parábola dos talentos, a cada um segundo suas capacidades.
- O importante é estarmos despertos, abertos à palavra de Jesus, a seus ensinos. Como diz Kardec no ESE, no cap XVII item 4: “Reconhece-se o verdadeiro espírita pela sua transformação moral e pelos esforços que emprega para domar suas inclinações más.”
4. Reflexão sobre as ilusões atuais
- São muitas as ilusões da vida moderna: dinheiro, poder, imagem, prazer, etc.
==> Nesse contexto da nossa reflexão, os vícios, como algo que nos encanta, nos fascina, que ficamos ansiando por fazer e quando começamos, não queremos parar, são ilusões, pois consomem nossas energias, nosso tempo (que é um recurso, um talento, que não volta), e não nos fazem crescer espiritualmente. Nem mesmo nos fazem crescer nos nossos compromissos sociais (estudo, trabalho, convivência sadia com a família, com os amigos).
No livro Espelhos da Alma, o autor coloca algumas ilusões atuais (fazer link com as respostas dos jovens na nuvem de palavras):
a) A ilusão do sucesso e da imagem: vivemos em uma sociedade em que a competitividade é vista como virtude. Desde criança, a educação é direcionada para sermos alguém de sucesso no mundo. O ser real que somos fica à margem, enquanto perdemos tempo na construção de uma personagem.
==> vocês concordam? Percebem isso?
E a ilusão do sucesso e de projeção da imagem, como constata Joanna de Angelis, leva a “uma terrível preocupação para ser visto, fotografado, comentando, vendendo saúde, felicidade, mesmo que fictícia. A conquista desse triunfo e a falta dele produzem solidão... o sucesso, decantado como forma de felicidade, é, talvez, um dos maiores responsáveis pela solidão profunda”. (O Homem Integral, Cap.1)
b) A ilusão do ter: novos deuses pairam soberanos no Olimpo da era moderna, muito vinculados à ilusão do sucesso: consumo, dinheiro e poder.
E nesse contexto, avalia Joanna de Angelis: “O ser, em si mesmo, é de quase secundária importância, desde que a aparência seja agradável, a posição tenha representatividade e o dinheiro se encarregue de resolver as situações embaraçosas”(Amor, Imbatível Amor, Cap. 6)
c) A ilusão do prazer: aprendemos a conhecer o mundo pelos nossos sentidos, e a sensação é uma das funções iniciais do processo de desenvolvimento. (...). Mas quando ficamos presos a percepção que vem através dela, uma das consequências é que a nossa visão a respeito do prazer permanece limitada ao que fere os nossos sentidos imediatos, e perdemos contato com outros prazeres, os prazeres da alma, que poderiam conduzir a percepções mais elevadas e ao autoencontro. (...)
E o problema não são os prazeres que a vida proporciona, mas a forma como esses prazeres são vividos.
Outras ilusões compõem o quadro psicológico no qual nos encontramos, e cada um é convidado a avaliar: qual é ou quais são as ilusões que me dominam? Somente nos libertando delas é que prosseguiremos no intento do autoencontro. Tal qual Ulisses, somos convidados a permanecer atados ao mastro da consciência, enquanto educamos as nossas próprias forças para não darem ouvidos ao canto das sereias, que se encontra em toda parte, vinculado à cultura dita civilizada, vendida pelos meios de comunicação e abrigada pela sociedade como um todo.
Somente a consciência poderá romper esse círculo vicioso, para que possamos finalmente mergulhar em nós mesmos, na viagem que temos postergado por várias existências.
==> importantes estarmos atentos aos cantos das sereias do mundo!
5. Conclusão
- É difícil viver no mundo, seguindo os ensinos de Jesus?
==> Como viver no mundo e ainda assim ser aquele que tem a terra boa, que dá frutos?
Kardec traz uma mensagem muito boa nesse mesmo capítulo que trata da parábola da semente: O Homem no Mundo! Está no conjunto das instruções dos Espíritos, item 10.
- pedir que os jovens leiam um parágrafo cada um, comentando o que entendeu do que foi lido.
- “Purificai, pois, os vossos corações; não consintais que neles demore qualquer pensamento mundano ou fútil.”
- “vivei com os homens da vossa época, como devem viver os homens. Sacrificai às necessidades, mesmo às frivolidades do dia, mas sacrificai com um sentimento de pureza que as possa santificar.”
- “Sede joviais, sede ditosos, mas seja a vossa jovialidade a que provém de uma consciência limpa, seja a vossa ventura a do herdeiro do céu que conta os dias que faltam para entrar na posse da sua herança.”
- “Basta reporteis todos os atos da vossa vida ao Criador que vo-la deu”
- “Aquele, pois, que se isola priva-se voluntariamente do mais poderoso meio de aperfeiçoar-se.”
6. Exercício de respiração profunda, prece e passes coletivos.
Avaliação:
Encontro com 8 jovens. Participaram das atividades e das reflexões. No final, a discussão principal foi a questão do vestibular, de fazer faculdade.
Anexos:
PARÁBOLA DO SEMEADOR (ESE, Cap XVII)
5. Naquele mesmo dia, tendo saído de casa, Jesus sentou-se à borda do mar; – em torno dele logo reuniu-se grande multidão de gente; pelo que entrou numa barca, onde sentou-se, permanecendo na margem todo o povo. – Disse então muitas coisas por parábolas, falando-lhes assim:
Aquele que semeia saiu a semear; – e, semeando, uma parte da semente caiu ao longo do caminho e os pássaros do céu vieram e a comeram.
– Outra parte caiu em lugares pedregosos onde não havia muita terra; as sementes logo brotaram, porque carecia de profundidade a terra onde haviam caído. – Mas, levantanto-se, o Sol as queimou e, como não tinham raízes, secaram.
– Outra parte caiu entre espinheiros e estes, crescendo, as abafaram.
– Outra, finalmente, caiu em terra boa e produziu frutos, dando algumas sementes cem por um, outras sessenta e outras trinta.
– Ouça quem tem ouvidos de ouvir. (S. MATEUS, 13:1 a 9.)
Escutai, pois, vós outros a parábola do semeador. – Quem quer que escuta a palavra do reino e não lhe dá atenção, vem o espírito maligno e tira o que lhe fora semeado no coração. Esse é o que recebeu a semente ao longo do caminho. – Aquele que recebe a semente em meio das pedras é o que escuta a palavra e que a recebe com alegria no primeiro momento. – Mas, não tendo nele raízes, dura apenas algum tempo. Em sobrevindo reveses e perseguições por causa da palavra, tira ele daí motivo de escândalo e de queda. – Aquele que recebe a semente entre espinheiros é o que ouve a palavra; mas, em quem, logo, os cuidados deste século e a ilusão das riquezas abafam aquela palavra e a tornam infrutífera. – Aquele, porém, que recebe a semente em boa terra é o que escuta a palavra, que lhe presta atenção e em quem ela produz frutos, dando cem ou sessenta, ou trinta por um. (S. MATEUS, 13:18 a 23.)
(S. MATEUS, 13)
10 Os discípulos aproximaram-se dele e perguntaram: "Por que falas ao povo por parábolas? "
11 Ele respondeu: "A vocês foi dado o conhecimento dos mistérios do Reino dos céus, mas a eles não.
12 A quem tem será dado, e este terá em grande quantidade. De quem não tem, até o que tem lhe será tirado.
13 Por essa razão eu lhes falo por parábolas: ‘Porque vendo, eles não vêem e, ouvindo, não ouvem nem entendem’. (...)
16 Mas, felizes são os olhos de vocês, porque veem; e os ouvidos de vocês, porque ouvem.
Espelhos da Alma, Cap 8, item “As Ilusões Humanas”
AS ILUSÕES HUMANAS
De acordo com as tradições da mitologia grega, em especial a célebre “Odisseia”, de Homero, quando Ulisses (ou Odisseu, para os gregos) retornava para casa, após a Guerra de Troia, ele permaneceu por algum tempo na ilha onde habitava a feiticeira Circe. Ela o advertiu quanto ao risco que corriam, ele e sua tripulação, quando escutassem o canto das sereias, pois a ilha na qual elas habitavam estava justamente no caminho de retorno do herói. Como o nobre guerreiro fazia questão de ouvir o famoso canto, sem que sucumbisse, a feiticeira o orientou para que tomasse algumas precauções: colocasse cera nos ouvidos de todos os marinheiros, e fosse atado ao mastro com a ordem de que ninguém o retirasse de lá, em hipótese alguma.
Logo partiram, e chegaram ao ponto em que o vento amainou, e um suave canto começou a ser ouvido, fazendo com que Ulisses, já atado ao mastro, começasse a se debater. As vozes irresistíveis cantavam: “Detém-te, honra dos Aqueus, famoso Ulisses. Ninguém passa daqui, sem que das bocas nos ouça a melodia. E com deleite e instruído se vai ...”(3)
E embora Ulisses tenha ficado completamente envolvido pelo canto irresistível, gritado e se debatido para que os marinheiros o libertassem para ir ao encontro das sereias, eles cumpriram o estabelecido previamente, e com cera nos ouvidos nem deram atenção aos apelos desesperados do seu comandante, salvando-o da morte certa.
Na mitologia grega, as Sereias “são monstros do mar, com cabeça e tronco de mulher, e o resto do corpo igual ao de um pássaro”(4) com garras de ave de rapina, tendo sido representadas com corpo de peixe somente posteriormente, a partir da mitologia nórdica. Psicologicamente, representam as ilusões, os desejos e as paixões humanas, que vividos em excesso tornam-se forças autodestrutivas. E esses são verdadeiros inimigos do autodescobrimento, pois conseguem iludir o ego imaturo.
Pensando nas ilusões da vida moderna, vemos que o ser humano permanece vinculado a inúmeras sereias, que, tais quais aves de rapina, retardam sua marcha de autodescobrimento, roubando energias preciosas que deveriam estar a serviço do Self. Aprisionada pelas ilusões, a energia psíquica vai sendo desviada do curso que poderia trazer significado à vida, e prossegue vinculada à inconsciência que marca grande parte da humanidade.
E são várias essas ilusões, sendo algumas delas:
A ilusão do sucesso e da imagem: vivemos em uma sociedade em que a competitividade é vista como virtude. Desde criança, a educação é direcionada para sermos alguém de sucesso no mundo. O ser real que somos fica à margem, enquanto perdemos tempo na construção de uma personagem. Aprendemos que a essência é menos importante do que a imagem projetada. E o custo de tudo isso é muito elevado.
Ao analisar A Sociedade do Espetáculo, o escritor francês Guy Debourd estabelece um dos paradigmas que marcam essa grande ilusão construída coletivamente: “o que aparece é bom, o que é bom aparece”. (5) E isso ganhou proporções enormes com a revolução nos meios de comunicação. Qualquer atividade, mesmo as que deveriam ficar restritas ao ambiente doméstico, ganha ares de “espetáculo”, e muitos sentem a necessidade de compartilhar nas redes sociais qualquer coisa que possa projetar sua imagem. O que está por trás dessa falsa necessidade? O ser humano aturdido, que tendo perdido contato com a própria realidade projeta uma imagem fictícia por não ter aprendido a lidar com sua angústia.
Aprofundando esse ponto de vista, o filósofo esloveno Slavoj- Zizek oferece uma analogia interessante quando avalia o processo de projeção de imagem, que ganha força na sociedade contemporânea. Para ele, “da mesma maneira que o café descafeinado tem cheiro e gosto semelhantes aos do café sem ser café, minha persona na rede, o ‘você’ que vejo lá, é sempre um ‘eu descafeinado. Por outro lado, existe também o excesso oposto, e muito mais perturbador: o excedente de minha persona virtual com relação ao meu ‘eu real”. (6)
As duas polaridades são faces do distanciamento entre persona e ser real. E isso toma proporções preocupantes no contexto coletivo. A neurose já não é um problema somente do indivíduo, mas de toda uma coletividade enferma.
E a ilusão do sucesso e de projeção da imagem, como constata Joanna de Angelis, leva a “uma terrível preocupação para ser visto, fotografado, comentando, vendendo saúde, felicidade, mesmo que fictícia. A conquista desse triunfo e a falta dele produzem solidão... o sucesso, decantado como forma de felicidade, é, talvez, um dos maiores responsáveis pela solidão profunda”. (Joanna, em O Homem Integral, Cap.1)
Por sua vez, o ser psicológico, desperto, não se importa se é ou não alguém de expressividade e sucesso para o coletivo que o cerca, mas dedica tempo e energia ao seu autodescobrimento, pois somente assim poderá ser pleno. Ciente de que tem seu valor intrínseco, não necessita projetar a imagem de alguém que não é, para que se sinta preenchido.
Afinal, o maior Homem que pisou na Terra não era um simples carpinteiro?
A ilusão do ter: novos deuses pairam soberanos no Olimpo da era moderna, muito vinculados à ilusão do sucesso: consumo, dinheiro e poder. E, além da Sociedade do Espetáculo, nos anos 70, outro francês, o filósofo e sociólogo Jean Baudrillard, apresentou A Sociedade de Consumo, chamando a atenção do tipo de comportamento (auto)destrutivo que estávamos construindo enquanto coletividade: “No Ocidente ao menos hoje, as biografias exaltadas dos heróis da produção cedem lugar a dos heróis do consumo. As grandes vidas exemplares... deram às estrelas de cinema, dos desportes e dos jogos... e o que sempre se exalta desses grandes dinossauros são os seus excessos e a virtuosidade dos seus gastos monstruosos. Ao exibirem-se cumprem uma função social bem precisa: a da exaltação do gasto, por procuração, para todo o corpo social”.(8)
Recordando as tribos primitivas, quando eles capturavam um animal, costumavam retirar sua pele e usá-la junto ao corpo, pois acreditavam que a força do animal passava para eles e os tornavam mais poderosos. Na tribo africana Macaya, por exemplo, o feiticeiro principal da tribo “veste-se de pelo de onça, cobrindo a cabeça com a pele de um leão, dando mostras do seu poder”(9) Algumas tribos faziam isso também com os seus inimigos de guerra. Em visita ao Museu Arqueológico de Vina dei Mar,(*) no Chile, pude observar algumas tribos que escalpelavam seus inimigos e faziam estacas de madeira com miniaturas de suas peles e cabelos, dizendo que a força dos seus espíritos agora os pertencia.
Na ilusão do consumo se faz algo parecido com esses costumes tribais. O valor daquilo que se compra e ostenta parece nos pertencer: um perfume famoso, a marca disputada, o carro potente, tudo isso ilude seus donos, fazendo-os pensar que sua personalidade agrega o valor do objeto possuído. Novamente, o valor intrínseco desconhecido é transferido às coisas, cuja transitoriedade traz consigo a angústia da
sensação de perda, levando a novos impulsos consumistas... Até que tenhamos a coragem de enfrentar o vazio existencial.
E nesse contexto, avalia Joanna de Angelis: “O ser, em si mesmo, é de quase secundária importância, desde que a aparência seja agradável, a posição tenha representatividade e o dinheiro se encarregue de resolver as situações embaraçosas”(10)
Ao tempo em que escrevia este capítulo, uma famosa modelo e estilista de Nova Iorque, eleita a melhor do seu ramo por sete anos consecutivos, foi encontrada morta em seu apartamento, aos 49 anos de idade; pelas evidências, a polícia concluiu que ela cometeu suicídio. Deixou para o namorado, um dos maiores astros da música de todos os tempos, uma herança estimada em U$$ 9 milhões. Uma grande fortuna, certamente, mas que não conseguiu preencher o seu vazio existencial.
E apenas um dos tantos exemplos daqueles que sucumbem, mesmo possuindo tudo o que o ego, normalmente, almeja: fama, beleza, dinheiro e poder. Mas isso não é o bastante para a alma, que pede que os próprios valores internos nos sustentem, independente da condição externa na qual nos encontremos.
No caminho do autodescobrimento, precisamos descobrir onde a ilusão do ter encontra morada em nós, diminuindo a força de atração que nos faz ceder a esse encantamento, adquirindo consciência dos verdadeiros valores que possuímos.
A ilusão do prazer: aprendemos a conhecer o mundo pelos nossos sentidos, e a sensação é uma das funções iniciais do processo de desenvolvimento. Isso não é um problema, pois a própria natureza nos direciona dessa forma para o aprendizado necessário. Mas quando ficamos presos a percepção que vem através dela, uma das consequências é que a nossa visão a respeito do prazer permanece limitada ao que fere os nossos sentidos imediatos, e perdemos contato com outros prazeres, os prazeres da alma, que poderiam conduzir a percepções mais elevadas e ao auto encontro.
Narram às tradições budistas que quando Sidarta Gautama encontrava-se meditando embaixo da figueira, com o propósito de atingir a iluminação, Mara, a deusa da ilusão, fez de tudo para que o príncipe desistisse do seu objetivo. E um dos primeiros artifícios utilizados por Mara foi tentar seduzir o príncipe pelo caminho do prazer sensorial.
Uma música envolvente fez-se presente no ambiente, enquanto mulheres lindas e perfumadas começaram a promover uma dança sensual, tentando desviar a atenção de Sidarta. Mas o príncipe se manteve imperturbável, vendo com naturalidade as imagens produzidas pela ilusão de Mara. E enquanto o cortejo das ilusões passava em sua frente, prosseguiu no seu objetivo e conseguiu atingir a meta, tornando-se Buda - o Iluminado.
No entanto, sem a disciplina e o olhar atento de Sidarta, são muitos que direcionam a vida ao prazer. E o problema não são os prazeres que a vida proporciona, mas a forma como esses prazeres são vividos. Na busca de autodescobrir-se, é necessário promover uma avaliação se são construtivos, dando sabor e ânimo à existência, ou se são destrutivos, para nós e para os que compartilham conosco, levando a resultados lamentáveis.
Freud percebeu o forte impulso psíquico para a realização do prazer, estabelecendo que: “Na teoria da psicanálise não hesitamos em supor que o curso tomado pelos eventos mentais está automaticamente regulado pelo princípio de prazer... (pois) existe na mente uma forte tendência no sentido do princípio de prazer, embora essa tendência seja contrariada por certas outras forças ou circunstâncias, de maneira que o resultado final talvez nem sempre se mostre em harmonia com a tendência no sentido do prazer”. (11)
No entanto, não obstante as pulsões orgânicas e de prazer, que Freud explicava através do Id, existe um processo psíquico muito mais amplo e profundo: a psique busca e promove a própria realização do ser, mas necessita da participação consciente para que sintonizemos, corpo e alma, nessa jornada profunda. Não se trata de uma negação do corpo e de todas as suas pulsões, nem mesmo do prazer, mas da canalização construtiva dessas forças. O corpo e a energia devem estar a serviço da psique, e não o oposto. Nesse sentido, a proposta da psicologia analítica, assim como da transpessoal e espírita, são mais profundas, ao constatarem uma finalidade que a psique busca sem cessar: a individuação, ou seja, a realização de si mesmo. Assim sendo, até o princípio de prazer deve estar a serviço do princípio de realização plena.
Mas as sereias do prazer permeiam toda a cultura, os Bacos modernos continuam com o seu séquito de loucura, e Mara encontra mentes e corpos disponíveis ao prazer a qualquer custo, demonstrando a infância psicológica e espiritual presente na civilização moderna. O ser fisiológico ainda tem predominância sobre o ser psicológico, e enquanto o indivíduo não se disciplina e educa, prefere os prazeres que possam saciar os sentidos, mesmo que a elevado custo para a alma.
Outras ilusões compõem o quadro psicológico no qual nos encontramos, e cada um é convidado a avaliar: qual é ou quais são as ilusões que me dominam? Somente nos libertando delas é que prosseguiremos no intento do autoencontro. Tal qual Ulisses, somos convidados a permanecer atados ao mastro da consciência, enquanto educamos as nossas próprias forças para não darem ouvidos ao canto das sereias, que se encontra em toda parte, vinculado à cultura dita civilizada, vendida pelos meios de comunicação e abrigada pela sociedade como um todo.
Somente a consciência poderá romper esse círculo vicioso, para que possamos finalmente mergulhar em nós mesmos, na viagem que temos postergado por várias existências.
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